O desenvolvimento de competências nas empresas está intimamente ligado à sua capacidade de organização estratégica e inovação em matéria da Gestão de Recursos Humanos.
O termo qualificações começa a dar lugar ao novo conceito de competências que tem um sentido mais amplo, envolvendo a formação escolar, profissional, a experiência, e novas atitudes perante o trabalho.
O posto de trabalho desenvolve-se, segundo esta nova óptica, para a organização, onde, um conjunto de atitudes e requisitos de acção exigem, da parte da empresa e do trabalhador uma polivalência e flexibilidade qualitativa.
O sistema de remunerações deve estar ligado ao desenvolvimento de competências, permitindo por si próprio, como força impulsionadora, a implementação da mudança organizacional rumo ao modelo da gestão pelas Competências.
O presente trabalho desenvolve a teoria segundo a qual o trabalhador precisa de estar motivado para ser capaz de enfrentar o novo modelo de competências. Essa motivação deve ser desenvolvida pela empresa, e o trabalhador também deve ser capaz de encontrar a auto-motivação que lhe permita tornar-se mais activo na sua profissionalização.
É muito importante o sistema remuneratório que a empresa promove, pois nele o trabalhador pode encontrar o feed-back do seu empenho e esforço. Ou até, através dele, desenvolver a vontade de aprendizagem permanente.
São estudadas as competências conceptuais, técnicas e interpessoais, que correspondem aos conhecimentos teóricos da profissão, aos conhecimentos organizacionais, ao domínio dos métodos de trabalho e das ferramentas, e às capacidades e atitudes.
Percebe-se em todo o estudo que o modelo de competências se adapta aos novos modelos Antropocêntricos de Gestão que centram os recursos humanos na unidade produtiva. E que, para alcançar bons resultados em competências e práticas salariais competitivas, esses modelos devem evoluir em concordância e lógica.
COMPETENCES AND SALARY PRACTICES
1 Introdução
O objectivo da tese é o estudo das implicações da implementação do desenvolvimento de competências nas organizações de trabalho, em correlação com o desenvolvimento das práticas remuneratórias. O objecto do estudo exploratório é uma empresa do ramo da construção civil. Pretende-se, no fim do estudo, aferir o interesse, quer pela parte da empresa, quer pela parte do trabalhador, no desenvolvimento de competências e práticas salariais.
Não quisemos deixar de abordar um tema que interessasse directamente às organizações de trabalho. Durante a carreira profissional sempre fomos percebendo que uma remuneração justa, equitativa e bem compreendida por todos pode ser uma mais-valia para o sucesso das equipas de trabalho. O tema foi centrado no desenvolvimento de competências e práticas salariais.
Há especialistas que começam a querer trocar o termo de qualificações pelo conceito de competências, enquanto outros usam os dois termos indiscriminadamente. A gestão de competências apresenta, contudo, vários problemas de medida para tomar como referência nas práticas salariais.
A flexibilidade das remunerações começa a ser uma prática cada vez mais desenvolvida nas organizações de trabalho que, não raramente, caminha a par com a individualização dos contratos. Ainda que muitos dos autores da Gestão de Competências entendam que é com contratos sem termo que se deve trabalhar e que são estes os que permitem uma estratégia de desenvolvimento de competências, de maior eficácia, pela parte contratante e contratada.
Este sistema, no entanto, não deixa de se revelar complexo, com dificuldades práticas de definição, conceptuais, mas sobretudo, segundo alguns autores, de muito difícil medição na empresa e posterior comparação com o mercado. Neste contexto percebe-se a relevância e pertinência do estudo.
A equidade revelada entre a força de trabalho que o colaborador dá à organização e a remuneração auferida desenha todo um tecido social que se impõe na sociedade, criando equilíbrios ou grandes desequilíbrios. A força das redes é também muito importante e cria novas lógicas.
Quanto à metodologia, o quadro teórico é feito através de um estudo bibliográfico, com resumos registados em fichas de leitura numeradas e recurso à informação da Internet. Todos os trabalhos recolhidos da Internet foram impressos e organizados de forma numérica, para podermos recorrer aos mesmos, sempre que houvesse necessidade. Construímos fichas resumidas dos autores que nos pareceram mais importantes e guardámo-las em índice numerado, com as palavras exactas dos autores. Recurso que fomos utilizando ao longo do tempo de estudo, para verificação. À medida que íamos trabalhando, só registávamos o número correspondente ao número da ficha em rodapé. No fim reconstruímos os rodapés correspondentes com a bibliografia e o número da ficha de leitura.
Recorremos também aos Boletins do Trabalho e Emprego para consultar alguns Contratos Colectivos de Trabalho e Acordos de Empresa, no sentido de verificar o seu ajuste na definição de desenvolvimento de competências e novas atitudes face ao trabalho; este estudo foi desenvolvido na parte curricular de mestrado.
Aproximadamente a meio do estudo, conseguimos chegar à definição dos conceitos, componentes, dimensões e índices. A partir da grelha de verificação, representada pelos índices e construídos como unidade de medida, criámos itens de classificação que pudessem ser usados como unidade de medida de cada um. Quanto às perguntas foram-se alterando ligeiramente até ao fim do estudo. O mesmo aconteceu com o modelo de análise que também foi sofrendo algumas pequenas alterações.
A procura de uma empresa que nos permitisse um estudo empírico revelou-se muito difícil, apesar das nossas múltiplas tentativas. Por isso agradecemos, com toda a sinceridade, à empresa e às pessoas que nos facultaram o estudo exploratório do tema. O estudo acabou por ser apenas exploratório, pela falta de tempo e espaço, e pela própria dificuldade de execução do estudo empírico, inerente ao tema. Para nós, avolumou-se a questão ao longo do estudo: Como desenvolvê-lo? Efectivamente um estudo empírico sobre um tema ainda pouco estudado é muito exigente. Além disso foi-se avolumando, também o problema da definição das medidas e da elaboração de instrumentos de observação fiáveis. Estes aspectos foram clarificados ao longo do estudo exploratório que fizemos na empresa de construção civil.
Foi preocupação nossa tentar procurar uma medida aplicável aos nossos conceitos e dimensões, de acordo com a profissão a estudar: a profissão de engenheiro; muito embora admitamos que seja possível aferir para um conjunto de profissões, mais alargado, com ligeiras adaptações.
Neste estudo pusemo-nos as seguintes questões:
- Existe uma necessidade de desenvolvimento de competências reconhecida pelo trabalhador? E pela empresa?.
- O desenvolvimento de competências gera um aumento de desempenho?
- Os baixos níveis de desempenho e de satisfação estão relacionados com a insatisfação remuneratória?
Um das questões implícitas ao estudo e que, como dissemos, nos ocupou bastante tempo foi também:
- Como se pode medir o desenvolvimento de competências e justificá-las numa prática salarial corrente e facilmente actualizável? Esta pergunta levou-nos à construção de instrumentos de observação que não chegámos a aplicar, mas que se tornaram em si mesmos parte integrante do estudo.
O estudo exploratório foi constituído por algumas entrevistas exploratórias a duas empresas diferentes. A entrevista a outra empresa teve como objectivo a triangulação de dados. No estudo exploratório realizámos algumas entrevistas semi-estruturadas e não-estruturadas, com o Director-Geral da empresa, o responsável dos recursos humanos e pequenas conversas com alguns funcionários administrativos. Resolvemos não fazer recurso à gravação das entrevistas para conseguirmos uma maior espontaneidade pela parte dos entrevistados, dada a delicadeza dos assuntos tratados. Isso exigiu-nos mais esforço de memória e melhor preparação das entrevistas; contudo, com mais facilidade nos podem falhar algumas perguntas, e isso aconteceu-nos. Também fomos fazendo observação directa em outras empresas de construção civil, no nosso dia-a-dia.
Este estudo exploratório destinou-se sobretudo à construção dos instrumentos de observação, pois não tivemos tempo suficiente para através dele chegar a conclusões, já que não chegámos a aplicar as medidas nem a empresa tinha implementado o modelo de competências. O estudo, destinou-se, também, a testar as perguntas, hipóteses e o nosso modelo de análise.
Em termos da organização da estrutura deste trabalho fizemo-lo em catorze pontos. O primeiro constitui o capítulo introdutório, onde se fala dos objectivos, metodologia, principais conceitos teóricos e estrutura do trabalho. No ponto dois deste estudo reflecte-se nas alterações do trabalho, o novo paradigma da competitividade, novos perfis de trabalho, flexibilidade e polivalência. No ponto três apresenta-se a questão da reorganização do trabalho referindo os novos modelos de produção. No ponto quatro reflecte-se nos actuais cenários, passando pela componente salarial nos direitos colectivos, a valorização dos recursos humanos e perspectivas para o futuro.
No ponto cinco desenvolve-se o problema das qualificações e competências. Apresenta-se o conceito de competências adoptado, as competências tecnológicas e o saber e preponderância do saber-fazer. No ponto seis desenvolve-se a questão das competências e do mercado de trabalho, pensando o problema da sua gestão nas organizações e a sua relação com a empregabilidade. No ponto sete do nosso trabalho apresentamos algumas formas remuneratórias, tipos de salários, tendências em alguns IRC’s e a introdução de um modelo de competências. As novas tendências da remuneração são referidas no ponto oito. Quanto ao ponto nove reflecte a questão das atitudes e cultura organizacional. O ponto dez, o problema da motivação e satisfação do trabalhador nas organizações de trabalho. No ponto onze apresentamos o nosso modelo de análise, perguntas e hipóteses e o estudo exploratório. Seguem-se as conclusões e bibliografia. Em anexos, apresentamos os instrumentos de observação que construímos e dados da empresa e estatísticas de empresas do sector da construção civil.
2. As alterações do trabalho e a organização do trabalho
2.1 O Novo paradigma da Competitividade
Os novos modelos de produção ou um novo paradigma produtivo ocupam hoje um lugar de destaque em todas as publicações recentes, colóquios e seminários sobre os processos de gestão e produção. Mas a matéria não é pacífica. Não há consenso sobre a emergência de um novo modelo produtivo, nem mesmo sobre o modelo anterior.
As empresas vêem-se, contudo, a braços com a necessidade de optarem por uma nova lógica produtiva imposta pelas tecnologias de informação e comunicação e por novas condições de mercado. A flexibilidade e rápida capacidade de adaptação às mudanças tornaram-se uma necessidade perante a emergência de mercados imprevisíveis. Para este novo quadro de produção exige-se capacidade de adaptação à mudança, novos recursos humanos e tecnológicos, competência, responsabilidade e iniciativa por parte dos executantes. Nota-se que estas novas condições e a introdução das novas tecnologias de informação são incompatíveis com o modelo de produção em massa. Pela parte dos diversos autores apresentam-se diferentes perspectivas de interpretação em relação à introdução das novas tecnologias. Fala-se numa sociedade pós-industrial ou sociedade de informação segundo uma perspectiva determinista.
A informação torna-se uma variável fundamental na economia, suplantando o trabalho e o capital como fonte de valor acrescentado. O novo tipo de sociedade é resultado da aplicação generalizada das novas tecnologias. As tecnologias de informação dão origem à sociedade de conhecimento e a tecnologia dita a marcha. Na perspectiva determinista é preciso que as pessoas se adaptem à tecnologia e não o contrário.
Numa perspectiva marxista, apesar das transformações, não se pode falar de ruptura e de emergência de novos modelos de produção. O modelo taylorista-fordista continua a subsistir nos mercados, posto que não há ruptura nos princípios em que se fundam as organizações, na forma como funcionam as empresas e nas relações sociais do trabalho.
Numa terceira abordagem há diversos modelos de produção que estão de acordo com as novas situações sociais históricas, concretas. Os novos modelos podem coexistir em diversos países, sectores, regiões, e até mesmo empresas.
Quando se fala de um novo paradigma da competitividade, invertem-se, de certa maneira, os antigos valores da riqueza. Considera-se que os processos que criam valor, como o conhecimento , se podem tornar mais importantes do que os recursos naturais e do subsolo.
Os investimentos chamados de imateriais, distinguem-se ao nível do conceito da competitividade que a economia global veio criar. A capacidade de inovar e criar novas gamas de produtos considera-se fonte de riqueza das economias dos países ou dos indivíduos. O uso criativo do conhecimento aplicado é que gera inovação e permite a introdução de novos produtos nos mercados.
A qualidade dos serviços, as novas formas das organizações de trabalho, ou de gestão, a excelência da formação, das competências e dos recursos humanos podem ajudar a tornar uma economia altamente competitiva.
A inovação, ou introdução de novos produtos, proporciona, pela via da competitividade, condições que permitem o desenvolvimento das regiões ou Estados que se empenham nesse processo. A inovação tanto pode corresponder a produção própria, que se aplica internamente e/ou mesmo exporta assim como se pode comprar a outros países e aplicar em prol da economia nacional.
Para poder acompanhar os princípios do novo paradigma, há conveniência em criar uma cultura de inovação que implica, no âmbito da pesquisa, esforços de fomentos de bolsas que induzam a inovação tecnológica , mobilizando o sector produtivo e o Estado.
Nota-se, nos mercados internacionais, que as empresas e os indivíduos são os primeiros a constituir-se como factores competitivos e não tanto os países. As empresas apresentam-se com alguma sensibilidade à envolvente, pelo que, as políticas globais afectam o seu comportamento. Os referenciais espacio-temporais dos negócios de hoje são completamente diferentes dos de há duas décadas atrás. O desenvolvimento das tecnologias da informação e comunicação, são muito importantes para definir o espaço em que se tornou a economia globalizada. Entende-se que se tenderá para uma relativa imobilidade dos indivíduos altamente qualificados, desde que saibam gerir as suas competências, a partir de qualquer ponto no espaço. Passa a considerar-se a grande mobilidade do saber, independentemente da consideração de maior ou menor mobilidade da organização.
Os recursos naturais, outrora factores de vantagem competitiva, revelam-se agora insuficientes, ganhando importância estratégica o conhecimento e a sua aplicação directa na economia. As empresas passam a jogar, ao mesmo tempo que as políticas globais e nacionais, um papel estratégico importante nas economias nacionais e internacionais, aparecendo como grupos de poder capazes de impor rumos e normas próprias.
Os conhecimentos, por seu lado, têm de ser aplicados na força produtiva para se tornarem em vantagem competitiva e induzir agentes de mudança. Torna-se de grande relevância a questão da criação de novas formas organizativas, a gestão das qualificações e a aproximação das unidades de I&D às empresas.
Podemos dizer que a excelência do conhecimento, recurso imaterial, passa a ser considerado como fonte de competitividade. As novas tecnologias de informação e comunicação, em particular a Internet, contribuem para que grande parte deste conhecimento seja partilhado por quase toda a população mundial, tornando-o mais democrático e de distribuição mais paritária do que os recursos naturais.
O maior desenvolvimento económico, competitivo, emerge na Ásia, que começa a aparecer como uma força competitiva dominante. A China e a Índia cresceram nos últimos 50 anos, em termos do Produto Nacional Bruto, mais do que durante vinte séculos. Isto quer dizer que um potencial de compras se incrementa nestes mercados, onde uma classe média emerge, com possibilidades acumuladas e um sistema de valores diferentes. O rápido crescimento económico da China e da Índia constitui uma revolução que está a mudar a face do mundo económico.
De acordo com o Goldman Sachs Bank, a China transformar-se-á na maior economia do mundo, em 2050, seguida pela Índia, depois pelo Japão, Brasil e Rússia. Finalmente, considera-se que a Europa, será um cluster de pequenas nações, com a Alemanha e Inglaterra à cabeça.
O mundo parece começar a trilhar um novo caminho, sem precedentes, de novos métodos de gestão. Muitos postos de trabalho serão extintos e a actividade das empresas não parará de se mover pelo mundo.
Considera-se que há muitos défices que são cíclicos, enquanto outros parecem ser estruturais: a Europa poderá vir a sofrer bastante e pode falhar a sua reforma interna. Segundo Stéphane Gareli muitas nações seguirão em frente enquanto outras falharão.
As empresas assumem uma posição estratégica na definição e aplicação de políticas nacionais e transnacionais. Facto que se pode assumir como preocupante, tendo em conta que existem muito poucas políticas macroeconómicas que definam um caminho de convergência mundial. E mesmo as políticas nacionais parecem assumir-se, por vezes, de forma pouco consistente.
De acordo com uma análise da Comissão Europeia, de 1995, Portugal, juntamente com a Grécia, apresentava os mais baixos níveis de produtividade.
No entanto, a variação de valor acrescentado foi superior à média europeia, o que permite antever um quadro de esperança, desde que se considerem boas políticas de financiamento e capital de risco. Esta análise refere, ainda, a importância das qualificações e formação profissional, sendo esta questão parte fulcral do nosso estudo, ligada, através dos índices, instrumento de medida, aos nossos conceitos de competências.
Na revista Dirigir, Carlos Barbosa de Oliveira, afirma que o potencial humano não é aproveitado pela maioria das empresas portuguesas , apesar de estar em causa a perda de rentabilidade, produtividade e competitividade das mesmas.
Neste documento, indica-se que uma das causas para este desfasamento, entre trabalhador e entidade patronal, reside na má preparação dos empresários, que têm, em média, uma preparação inferior à dos seus colaboradores.
Nas actividades de I&D , em Portugal continua a investir-se muito pouco e estas actividades estão muito pouco ligadas ao tecido empresarial. Uma ligação directa das actividades de I&D ao tecido empresarial permitiria o imediato registo de patentes e desenvolvimento, bem como a introdução de novos produtos. O actual quadro do emprego em Portugal mostra-nos taxas de desemprego em alta , a crescer nos mais qualificados e jovens, salários em baixa, muitas falências, e aumento do desemprego (2,6%) nos serviços.
Como refere Ilona Kovács em Novos modelos de Produção, o futuro parece depender dos actores sociais, das suas capacidades e vontades, e do grau de democraticidade que se implementa nos processos de transformação. Entende-se como essencial uma reflexão sobre as actuais transformações do processo produtivo e percebe-se a necessidade de repensar como fundamental a dimensão social do fenómeno. A renovação da análise sociológica assemelha-se como fundamental para poder mostrar o limite de algumas abordagens de discursos oficiais, futuristas e, também, para poder perceber e analisar situações reais pouco claras.
Quer-nos parecer que, à medida que a escola perde a exclusividade de formação, se torna mais difícil desenvolver e implementar estratégias de formação. Esta responsabilidade salta, agora, para a esfera de vários actores, incluindo o próprio indivíduo, ao longo da sua vida activa. Encontramo-nos perante uma realidade nova, que é a das empresas, e das empresas de formação, de formarem e educarem, ou instruírem pessoas ao longo da vida.
Estamos perante um novo conceito, o de comunidade educativa, em que já não aparecem só as escolas, mas muitos outros actores sociais, pois o sistema de aprendizagem evolui, cada vez mais, ao longo da vida.
Portugal parece caminhar no sentido da transformação para uma economia periférica que torna difícil a conquista das pessoas para a causa do desenvolvimento das qualificações e competências, sobretudo se os licenciados não são inseridos no mercado de trabalho.
2.2 Novos Perfis de trabalho – autonomia e descentralização
Cada vez mais se aceita a necessidade de desenvolvimento de recursos humanos como uma premissa da economia de hoje. A capacidade dos recursos humanos de produzirem valor acrescentado condiciona a competitividade das empresas e de toda a economia. Por essa razão se reconhece a necessidade de investir na educação e formação, seja nas escolas, nas empresas ou em toda a comunidade educativa.
O trabalho, o emprego e as competências necessárias sofrem grandes alterações com a pressão da economia e do desenvolvimento das novas tecnologias, aliadas a novas formas organizacionais. Verifica-se uma tendência global para o aumento das qualificações e para tornar as tarefas mais complexas, o que exige novas atitudes.
Nota-se uma “ilusão tecnicista” em que se espera a solução dos problemas, pela via tecnológica, mas também já se verificam casos com maior consciencialização, em que se percebe que a exploração da capacidade tecnológica depende da capacidade e qualidade dos recursos humanos e da organização do trabalho.
A autonomia é um dos aspectos essenciais do trabalho do novo paradigma de produção. Consiste no facto de o trabalhador se dotar das suas próprias regras de funcionamento. Não chega querer ser autónomo. A autonomia conquista-se activamente, se preciso transgredindo as regras. É preciso ter a capacidade de se opor, se necessário, e de se tomar vantagem. No entanto, a verdade é que parece necessário ter um grau de autonomia elevado, e/ou promovido, para conseguir impor-se.
Philippe Perrenoud entende que há dois níveis de competência que estão em jogo no exercício da autonomia. Por um lado, temos as competências, através das quais é necessário provar que nos deixam agir no exercício de um domínio definido, que podem ser a informática, atribuição de bolsas, organização de férias, educação e outros. Por outro, temos as competências estratégicas onde é preciso alargar a margem de iniciativa ou fazê-las reconhecer formalmente.
Estas competências estratégicas são menos dependentes de um contexto e mais de ordem psicossociológica. Permitem ocupar posições dominantes, estabilizar posições instáveis, desqualificar outras pessoas e fazer reconhecer o domínio de acção.
Perrenoud identificou oito tipos de competências:
- Saber identificar e valer os seus direitos.
- Saber, em grupo, ou individualmente, conduzir projectos e desenvolver estratégias.
- Saber analisar as situações e as relações de força de forma sistemática.
- Saber cooperar, agir em sinergia, participar colectivamente, cooperar em liderança.
- Saber construir e animar as organizações e os sistemas de acção colectiva e de tipo democrático.
- Saber gerir e resolver os conflitos.
- Saber jogar com as regras e ter a capacidade de propor outras mais adequadas.
- Saber propor ordens negociais apesar das diferenças culturais.
No seu entender, a escola joga um papel fundamental podendo ajudar a reconhecer a dose de autonomia que é necessária à vida, bem como os meios para a alcançar e manter. Philipe Perrenoud indica que, em família, estas regras podem ser ensinadas por aqueles que já ocupam posições de poder.
Um outro aspecto importante que parece vir a modificar os perfis de trabalho é a forma descentralizada da tomada de decisão. Alvin Toffler diz que está a emergir a “Civilização da Terceira Vaga” que vem substituir a Civilização Industrial de Segunda Vaga. As notadas crises da nossa época afectam os valores e as estruturas económicas, políticas, culturais e familiares. Em vez de uma sociedade altamente centralizada, esta nova sociedade identifica a tomada de decisão muito descentralizada. Constrói-se mais à volta de uma rede do que de uma hierarquia de novas instituições. Aparecem novas formas de organização com hierarquias mais planas e estruturas mais transitórias a que o autor chama a adocracia. Caminha-se, assim, para a descentralização e auto-ajuda.
2.3 As diversas formas de flexibilidade
Formas flexíveis de emprego são normalmente inseguras e mal pagas. Em vez de contribuírem para a melhoria da vida familiar, podem acabar por criar grandes problemas financeiros às famílias, já que a sociedade se organiza segundo o pressuposto do emprego seguro. Ao mesmo tempo transfere-se o risco do empregador para o empregado, que deve melhorar as suas qualificações e gerir o seu desenvolvimento de competências. Esta flexibilização do trabalho também transfere o risco para o Estado, já que se torna impossível gerir e pagar as qualificações e competências e os indivíduos não podem suportar os riscos das suas doenças. As políticas governamentais flexíveis parecem ignorar os seus efeitos sobre as empresas. Que são, por exemplo, a desestabilização dos recursos humanos, que se pode tornar num entrave à melhoria da competitividade da empresa.
Afirma-se que quanto maior for a aposta no caminho da flexibilização do emprego maior será a dificuldade de desenvolver a flexibilidade organizacional relativa a comportamentos e aspectos sociais. O permanente recurso a trabalho temporário pode mesmo impossibilitar o desenvolvimento de competências que podem ser estratégicas para as empresas. Bipolarizam-se os tipos de emprego.
Uns periféricos e mal pagos e outros com necessidades de se apoiarem em recursos humanos qualificados e integrados, de forma a estarem preparados para lidar com a inovação e processos cada vez mais complexos. Mas o princípio de fazer mais com o mais baixo custo, com mão-de-obra pouco qualificada ou insuficiente pode resultar na “perda de memória colectiva”.
Tudo pode ser fragilizado com a difusão de formas flexíveis de emprego. Corre-se o risco de bloqueamento do desenvolvimento da inteligência produtiva e de não se poder aumentar a produtividade a longo prazo. Deve referir-se que, apesar de assistirmos à reestruturação profunda das empresas, não existe um consenso relativamente à natureza das mudanças. Uns defendem que não há ruptura de paradigma. Outros, pelo contrário, entendem que a nova era da informação, com um novo tipo de economia, caracterizada sobretudo pela flexibilidade e baseada no conhecimento, cria uma ruptura nos processos e métodos de trabalho.
A renovação organizacional tende a ser encarada como um meio essencial para a melhoria da competitividade das empresas. O novo modelo pós-fordista é apresentado como uma ruptura em relação aos anteriores e um avanço de novas formas produtivas. Torna-se relevante a cultura da empresa, a confiança mútua, a autonomia, a participação, a cooperação entre indivíduos e equipas e unidades e empresas, no sentido da melhoria da qualidade. Este novo modelo resultaria em estruturas simplificadas e descentralizadas, com menos hierarquias e mais democráticas. Os recursos humanos acabariam por se tornar um valor precioso pelo desenvolvimento das competências, com vista à realização de trabalho inteligente em redes de cooperação.
Aliada à flexibilidade empresarial aparece a flexibilidade salarial e inúmeras formas de contratação, incluindo a individualização. Um trabalhador polivalente tem uma série de competências que ampliam o campo das tarefas que ele é capaz de cumprir sem custos ou atrasos. Há uma ideia de adaptabilidade que está no seio do conjunto de pressupostos das empresas flexíveis. Normalmente apresentam uma estrutura simples com reduzidos níveis hierárquicos e nelas dominam a comunicação intra-empresa. O estilo de gestão é criativo e promove-se a aprendizagem colectiva, a autonomia e a polivalência.
Distinguem-se, nestas empresas flexíveis, as medidas de flexibilidade qualificantes.
A flexibilidade qualitativa consiste na melhoria constante dos recursos humanos. A flexibilidade interna permite variar o número de horas de trabalho sem modificar o número de trabalhadores. O trabalhador ideal parece ser aquele que é de inegável competência, que se identifica com os objectivos da empresa, mas que sai quando o mercado ou a empresa necessitam. A flexibilidade do mercado de trabalho resulta em condições instáveis e concorrência acrescida. Afirma-se que a procura instável não é compatível com um emprego estável. A flexibilização permite chegar à mão-de-obra barata, mais produtiva e mais competitiva, segundo os ideólogos do mercado de trabalho flexível.
De acordo com Ilona Kovács surgem no mercado de trabalho novos cenários, novos actores e novas racionalidades. A sociedade de informação e conhecimento deixa antever um quadro generalizado de trabalho inteligente em consequência das TICS. Camila Minamide reforça que o trabalho passa a assumir uma esfera mais intelectualizada e torna-se menos dirigido e menos prescritivo. Assumem-se domínios cognitivos mais complexos. Valoriza-se o saber durante a experiência profissional que é um aspecto positivo. Por outro lado há uma intensificação dos horários de trabalho, há uma desprofissionalização por via de uma polivalência acentuada, “limitada e ilegítima pela supressão dos postos de trabalho. “Acrescem de novo o stress, a ansiedade, e as relações de trabalho inseguras.
Segundo Zarifian, as empresas podem competir no mercado através de três tipos diferentes: excelência operacional, inovação ao produto e orientação para o serviço, mas acrescenta que a flexibilização da mão-de-obra é incompatível com um programa de qualificação. E este aspecto parece-nos muito importante.
Junta-se à flexibilidade empresarial uma flexibilidade salarial e uma multiplicação das formas de contratação, bem como uma maior repartição do tempo e espaço de trabalho. Várias medidas no sentido da polivalência são adoptadas, em particular as medidas de flexibilidade não qualificantes. Este tipo de medidas pode conduzir a uma segmentação da mão-de-obra, a baixos níveis de qualificação e de acesso à informação e a uma integração laboral contratual muito frágil. Pelo contrário, as medidas de flexibilidade qualificantes favorecem a integração, a polivalência e o aumento das qualificações. O aumento do trabalho flexível, na Europa, repercute-se na transferência de riscos e custos dos empregadores para o Estado e para os trabalhadores.
Será importante referir que a flexibilidade organizacional e profissional (qualitativa) se inclui numa lógica diferente da flexibilidade quantitativa do emprego que caracteriza o modelo neotaylorista. A flexibilidade profissional e organizacional centra-se numa lógica de valorização dos seus recursos humanos. A flexibilidade quantitativa segue uma lógica de desvalorização destes mesmos recursos no sentido de conseguir a mão-de-obra mais barata. Para o conseguir tem-se apoiado muito na substituição da mão-de-obra por novas tecnologias, contratos a prazo e trabalho temporário.
3. Reorganização do trabalho
3.1 Neotaylorismo
O modelo neotaylorista aparece como um modelo de produção, baseado nos princípios de produção em massa e adaptado à nova era de automatização de processos produtivos. Recorre-se à polivalência de funções e alargamento de tarefas, sobretudo no sentido de não permitir falhas na produção e serviços. Os recursos humanos são de um modo geral pouco qualificados e a empresa quase não investe em formação. A perspectiva neotaylorista faz-se notar por um forte protagonismo patronal nos processos de inovação. Revela-se, numa perspectiva tecnocêntrica, através de um taylorismo assistido por computador, com ênfase na flexibilização quantitativa e desemprego massivo. Para Ilona Kovács as novas tecnologias servem, nesta perspectiva, para exercer um maior controlo sobre o trabalhador, para aumentar a qualidade de produtos e serviços, e aumentar a produtividade por trabalhador. Cria-se uma flexibilização quantitativa da mão-de-obra, com forte incidência de trabalhadores não qualificados. A sua estrutura organizacional é vertical, fortemente hierarquizada, e com um controlo integrado e centralizado. A organização do trabalho é fragmentada, com alargamento e rotações de tarefas.
Quanto às qualificações, para Marcelle Stroobants, são entendidas como um conjunto de saber e saber-fazer. O neotaylorismo não aproveita o conhecimento adquirido através da experiência dos trabalhadores, facilmente lançando em reformas antecipadas, aqueles que a possuem, a troco de jovens mais qualificados, mas sem experiência. O seu objectivo central é a redução dos custos e o aumento de produção. Criam-se mecanismos de subcontratação, de trabalho temporário, aplicado sobretudo ao sector feminino japonês e ao sector de emigrantes na Europa Ocidental.
Países como a Argentina e o México são os mais avançados na implantação do modelo neotaylorista como uma força hegemónica. Este modelo tem graves repercussões nas condições de trabalho. Uma delas é a flexibilidade laboral que está associada à precaridade do trabalho consistindo esta na criação de empregos clandestinos, contratos a termo certo e trabalhadores eventuais.
Como estas formas de contratação permitem ao empregador reduzir os custos de trabalho, tornam-se em formas de contratação que avançam cada vez mais.
Segundo Elias Milano, as consequências desta situação são a insegurança no mercado de trabalho, dificuldade de segurar o emprego, falta de normas de vigilância, higiene e segurança, insegurança no cumprimento das condições contratuais (prestações sociais, indemnizações por despedimento ou acidente) e exclusão do sistema de segurança social.
3.2 Lean Production
Existe, actualmente, no contexto da competição da economia global, uma pressão no sentido da redução de custos. Se uma empresa anuncia despedimentos, promete mais lucros e a sua cotação sobe rapidamente na bolsa. Mesmo em caso de fusões notam-se ocasiões para reduzir o número de empregados ou efectuar o downsizing. Há hoje uma grande inspiração nos modelos Lean Production e da reengenharia, tendo-se tornado, esta última, em alvo de grandes campanhas de marketing, proclamando a excelência do seu modelo. E, não havendo programas nacionais, as grandes empresas de consultoria ditam o caminho. Sempre que é possível diminuir os custos, o investimento torna-se mais apelativo. Hoje em dia os accionistas detêm o poder nas empresas e a estes interessa, de uma maneira geral, um retorno rápido aos lucros.
Os princípios da Lean Production baseiam-se nos zero-defeitos, zero-espaços, zero-stocks, zero-tempo de preparação e controlo burocráticos. Pretende-se eliminar tudo o que não produz valor acrescentado. Os princípios da Qualidade Total são integrados por cada trabalhador. O controlo de Qualidade é uma função permanente. Desenvolve-se o trabalho em equipa. Responsabiliza-se, ao nível da execução, pelas melhorias dos produtos de acordo com os princípios Kaizen – princípios de melhoria contínua.
Reconhecem-se as ideias e sugestões dos trabalhadores e estimula-se o aparecimento de novas propostas para melhoria de processos em execução. Os colaboradores são envolvidos nas decisões operacionais, mas não estratégicas.
O perfil do trabalhador é flexível, polivalente e empenhado. Há uma combinação entre flexibilidade quantitativa e qualitativa. Nota-se, também, um predomínio de trabalhadores qualificados e preocupação com a formação pela parte da empresa. Os processos de comunicação são ascendente e descendente. Os principais fornecedores são envolvidos no desenvolvimento de produtos. Há neste modelo, uma ênfase na integração da concepção e venda, encontrando-se esta forma organizacional mais adaptada às unidades industriais.
A Toyota foi pioneira do modelo Lean Production, através do qual eliminou tudo o que não era estritamente necessário à produção, criando as chamadas empresas magras, à custa da participação de equipas dedicadas. Foi por esta forma que foi conseguindo chegar ao emagrecimento dos recursos humanos e económicos.
A implementação deste modelo exige esforços no sentido da criação de políticas de emprego e formação que se lhe adaptem. Mas há dificuldades de implementação que lhe são inerentes. Por um lado, dificilmente se chama os trabalhadores para a participação voluntária em processos de emagrecimento, que poderão acabar por custar, a muitos deles, os seus postos de trabalho. A lógica de cada trabalhador será, naturalmente, a da manutenção do seu emprego com segurança e salário bem remunerado.
Por outro lado, o desenvolvimento das funções numa empresa deverá ir muito para além do conhecimento e técnicas acumuladas que se desenvolvem e ensinam, durante, e, no posto de trabalho. O desenvolvimento das funções exige tempo e dedicação ao seu exercício na estrutura. A instabilidade permanente no emprego não permite o desenvolvimento de um saber acumulado que a maior parte das funções exige, acabando por gerar grupos de colaboradores desligados dos interesses e valores das organizações.
Acrescenta-se que a necessidade de desenvolvimento do trabalho em equipa, inerente à filosofia da Lean Production exige, da parte dos colaboradores, desenvolvimento, conhecimento dos outros e confiança. Tudo isto é igualmente difícil de cumprir e atingir com quadros de pessoal instáveis.
A forma de ultrapassar estas barreiras, já identificadas, tem sido através do recurso à criação da integração vertical, criando-se uma nova lógica taylorista, desta vez, fora da empresa. A empresa contratante, ou empresa cabeça, organiza-se com uma rede de empresas subcontratadas, as empresas-mão, para a execução de trabalho menos qualificado.
3.3 Reengenharia
Se os princípios da Lean-Production estão vocacionados para a indústria, os da reengenharia são vastamente aplicados nos sectores de serviços. A reengenharia propõe uma inovação organizacional radical, na medida em que pretende partir do zero em relação a tudo o que dizia respeito ao quadro de referências anterior da empresa, onde o processo vai ser aplicado. O seu principal objectivo visa obter mudanças drásticas. Os seus princípios básicos são a orientação para o cliente. Defende-se a horizontalização focalizada nos fluxos e procedimentos. Pressupõe-se um estímulo à polivalência, à aprendizagem, desenvolvimento profissional e criatividade dos seus colaboradores. Defende-se uma definição clara das responsabilidades e enriquecimento de tarefas. Estimula-se a participação nos processos e melhorias contínuas para criação de feedback em cada etapa de cada processo de trabalho. Procura-se uma concentração nos outputs e inputs com articulação da avaliação de desempenho e prémios.
Para James Womack no processo de reengenharia está implícito o Downsizing. A reengenharia é aplicada numa perspectiva de imposição de mudança organizacional, executada sem a participação dos colaboradores. Neste processo, está implícito algum desprezo pelo que a empresa representou até aí. Todo este esforço de mudança deve ser vendido como Marketing, para impor a necessidade de mudança, realizada de cima para baixo. O fanatismo do líder da reengenharia é fundamental para que possa transmitir a necessidade imperiosa de uma metamorfose purgante. Nos Estados Unidos, grande parte das empresas dos sectores de seguros e telecomunicações implementam processos de reengenharia, sendo a Banca um dos sectores mais resistentes.
Jean Brilman em L’entrepise reinventé refere que a maior parte das empresas que aplicaram a reengenharia parecem satisfeitas com os resultados obtidos. Em dois terços das empresas, o trabalho é feito por consultores, enquanto o outro terço executa o processo de reengenharia por via interna. Estas empresas consideram, também, que a reengenharia é um forte aliado da Qualidade total.
Entende-se que os grandes dificultadores do processo são normalmente as chefias de topo por temerem a ameaça dos seus lugares. As equipas de reengenharia devem ser constituídas com os mais capazes e mais brilhantes, devendo o processo acabar com uma reformulação de salários e recompensas.
O principal problema da reengenharia e Downsizing é que lança porta fora talentos e parte da memória colectiva das organizações, acabando por gerar desmotivação e dispensar know-how imprescindível à organização. Devido à instabilidade permanente, sentida pelos colaboradores, criam-se boatos e problemas de comunicação. Deterioram-se a qualidade, os serviços e o ambiente de trabalho. Entende-se, também, como aspecto negativo a ênfase na tecnologia que remete para segundo plano os recursos humanos.
Os colaboradores, nas empresas com processo de reengenharia, acabam muito sobrecarregados com a quantidade e qualidade das tarefas. O trabalho torna-se muito intenso e gera-se uma desconfiança e angústia permanente em relação ao posto de trabalho e à organização. Por último, a reengenharia, tendo em conta uma modernização a todo o preço, na óptica da redução de custos, não toma em consideração o problema da empresa a longo prazo.
3.4 Os Sistemas Antropocêntricos de Produção
Os Sistemas Antropocêntricos de Produção utilizam recursos humanos qualificados e tecnologias flexíveis adaptadas a quadros organizacionais descentralizados e sobretudo participados. Defende-se que estes sistemas se adequam melhor às exigências dos novos mercados. As suas vantagens já foram confirmadas por numerosas experiências. Vários estudiosos entendem que é preciso promover o novo paradigma formativo.
Segundo Ilona Kovács os novos princípios organizacionais implicam, sobretudo, a autonomia, a criatividade, o profissionalismo, a descentralização, a participação e a cooperação. Deve estimular-se o trabalho em equipa, a livre comunicação, a descentralização de informação e a promoção de participação.
A perspectiva Antropocêntrica parece ser a única que coloca todos os seus recursos humanos no centro dos processos produtivos. Aposta em recursos humanos polivalentes e altamente qualificados. A dimensão social aparece como um valor estratégico e as pessoas são incentivadas a desenvolver as suas competências pessoais.
A tecnologia adapta-se ao ser humano, e não o inverso, e o trabalhador tem influência directa na organização do trabalho. Este sistema apresenta-se como um novo paradigma, o único que põe em causa os princípios tayloristas.
Responde às necessidades dos indivíduos com escolaridades cada vez mais elevadas, que preferem um trabalho mais participado e variado.
Helena Lopes refere que se desenvolvem as qualificações no âmbito de uma organização flexível, molda-se a tecnologia ao homem. Desenvolve-se a cooperação, o trabalho em equipa, estruturas menos hierarquizadas e descentralizadas. O objectivo é uma efectiva democratização das organizações de trabalho.
Parece importante referir que o ser humano é o único que dispõe de todas as competências para pôr todo o processo produtivo a funcionar; por isso, deve ser, o requisito primeiro, e mais valorizado. Só ele é dotado de iniciativa. Só ele pode tomar decisões e implementá-las. Além disso, é dotado de capacidade de aprendizagem individual e colectiva. Este modelo de Sistemas Antropocêntricos de Produção surge como alternativa à produção magra que dominou fortemente os anos 90. É indicado como o modelo mais apropriado à implementação do modelo de competências.
4. Actuais cenários
4.1 A componente salarial nos direitos colectivos
O Direito do Trabalho constitui-se como uma preocupação que uniformiza as respectivas soluções. Do ponto de vista colectivo existem ainda normas diferenciadoras e específicas. A regulação das condições de trabalho é feita através de Instrumentos de Regulamentação colectiva de trabalho (IRCT’S). O modelo português é considerado um modelo de negociação estática ou contratual. Parte-se da ideia de que os processos negociais se identificam por um resultado, chamado de “convenção colectiva”, que fixa as condições de trabalho por um período de tempo.
Para Paulo Pereira de Almeida e Glória Rebelo a noção de negociação colectiva associa-se à ideia da resolução de conflitos de trabalho, aceitando-se o carácter evolutivo da mudança. A convenção colectiva estabelece-se entre uma empresa, uma pluralidade de empresas, ou organizações de empresas, que são respectivamente o Acordo de Empresa, Acordo Colectivo e Contrato Colectivo.
Muitos dos aspectos da contratação colectiva, nomeadamente a formação profissional, a mobilidade e a organização de trabalho têm sido revistos no sentido de começar a racionalizar a gestão.
O discurso neo-liberal utiliza a crise do fordismo como forma de ataque às legislações laborais e às reivindicações sindicais. Um conceito chave deste processo consiste na desregulação da protecção aos trabalhadores. O objectivo é reduzir a negociação colectiva e passá-la para a negociação directa empregador-contratado. Na Grã-Bretanha, para citar um exemplo onde a aplicação do modelo neotaylorista tem vindo a ser bastante implementado, a legislação laboral chegou a estabelecer normas restritivas às garantias de acção social. Em termos gerais, esta ofensiva é praticada em diferentes países, mas podemos assinalar com particular ênfase o México, a China e a Alemanha.
Apesar disto, entende-se que os sindicatos são, ainda, para os trabalhadores núcleo da empresa, um interlocutor válido. Com os outros trabalhadores torna-se muito difícil estabelecer uma conexão, porque a sua rotatividade é muito forte e têm normalmente uma consciência política e organizativa muito baixa.
No novo quadro produtivo, as relações sindicais, segundo Luís António Cardoso, parecem dever adaptar-se aos novos arranjos da produção, tendo em vista o tipo de empresa, as mudanças induzidas na Gestão de Produtos e as mudanças na organização do trabalho.
As novas tecnologias produtivas e de gestão apresentam-se muito dependentes do envolvimento do trabalhador. Este processo torna a relação salarial como uma questão contraditória, em termos da representação de interesses dos trabalhadores. Como consequência deste facto, desenvolveram-se, na opinião de Luís António Cardoso, relações sindicais bastante heterogéneas.
Para analisar totalmente a relação entre Gestão de competências e o Direito de Trabalho é necessário perceber a importância dos Instrumentos de Regulação Colectiva. Devemos, pois, ponderar a questão do interesse individual profissional e do interesse colectivo. Enquanto o interesse profissional individual é uma questão isolada, o interesse colectivo pertence a um conjunto, a uma maioria dos componentes de uma colectividade de pessoas indeterminada.
Por vezes, a questão dos direitos colectivos corresponde a um mero somatório das partes, incluindo o sacrifício das partes individuais. As normas jurídicas criadas pelas convenções colectivas fixam condições que se impõem aos contratos individuais de trabalho, tanto no conteúdo obrigacional como normativo.
O diálogo social é reconhecido enquanto dimensão social do modelo europeu. Os parceiros sócios apresentam, directamente, os interesses e as problemáticas que se ligam ao mundo do trabalho. Contam-se a formação contínua e a definição de novas formas salariais. É um elemento da governação democrática e da modernização económica e social. Na gestão positiva da mudança tenta conciliar-se a flexibilidade indispensável às empresas e a segurança de que os trabalhadores necessitam. O diálogo social afirma o seu lugar único na governação democrática e considera-se a chave para uma governação melhorada. Segundo a Estratégia de Lisboa é preciso investir na formação conjunta dos responsáveis acerca das grandes questões europeias. São reconhecidos os níveis, nacional, local e a empresa. O FSE é o instrumento que regula o apoio à execução da estratégia do emprego. No âmbito da avaliação intercalar de 2002 a 2006 indica-se especial atenção à estratégia europeia do emprego.
Parece importante referir as manifestações de Paris, aquando da negociação da proposta do CPE, que propunha que um jovem até aos 26 anos pudesse ser despedido sem justa causa, e constatar que as massas continuam a manifestar-se e a ser facilmente manipuladas, se os interesses são percebidos por todos.
4.2 Reestruturação empresarial e a valorização dos recursos humanos
Na perspectiva de Robert Boyer, nos passados anos 60, alguns industriais conservavam ainda a ideia original de Taylor, no sentido de ser preciso reduzir ao máximo os tempos de aprendizagem e saber. Trinta anos depois, esta visão alterou-se com a procura de trabalho não qualificado a diminuir em termos relativos e absolutos. Os processos produtivos exigem agora um mínimo de conhecimentos e capacidade de raciocínio abstracto. A formação e a requalificação da mão-de-obra permitem, aos trabalhadores que dela usufruem, uma maior probabilidade de inserção no novo modelo de produção.
De acordo com Robert Boyer, a educação geral, a qualidade dos cursos de aprendizagem, a natureza das relações entre formação profissional e a dinâmica das empresas, parecem condições necessárias à difusão de um novo modelo de produção.
Contudo, os métodos de gestão fordistas são difundidos ao ponto de se tornarem um obstáculo à inovação de um modelo, pelo que muitos dos esforços oficiais que apontam a necessidade de mudança de um modelo industrial não surtem grande efeito.
Para Crozier, em A Empresa à escuta, a nova via organizacional opõe-se à organização clássica de funções especializadas e coordenadas. Esta nova via toma em consideração o sistema humano em sentido lato. Gerir a mão-de-obra não será mais programar as pessoas como no tempo da Organização Cientifica do Trabalho, mas antes mobilizar as capacidades individuais e colectivas e desenvolvê-las para outros fins. A nova necessidade para as novas organizações será a de profissionalizar os homens em vez de sofisticar as estruturas e procedimentos.
Crozier refere-se a uma outra visão da organização afirmando que o investimento no desenvolvimento dos homens deve fazer-se pelo conhecimento, pela formação e pela experiência. E, segundo o autor, deve ocupar cada vez mais espaço em relação ao investimento material. Este autor refere que se deve passar do social quantitativo ao humano qualitativo, sendo o recurso humano valorizado nesta acepção.
Por outro lado, afirma Alain Lipiez Benko, as estratégias neo-tayloristas de produção não estão preocupadas com os recursos humanos e a sua formação, fora do grupo de elite qualificada, como já vimos. Esta estratégia conduz a uma polarização das qualificações e a uma sociedade dual, no mercado de trabalho, e na sociedade em geral. Parece que esta via, neo-taylorista, é a escolhida, em grande parte pelo capitalismo norte-americano, britânico e francês.
De igual modo, as estratégias de emagrecimento das empresas, mesmo que reconhecendo a necessidade da qualidade dos recursos humanos, acabam por remeter para segundo plano a valorização desses mesmos recursos, fora das empresas cabeça, notando-se que os trabalhadores, dada a sua insegurança no emprego, não se sentem muito estimulados a investir nas suas carreiras.
À medida que o modelo de produção em massa comece a ser abandonado a favor de novos modelos de produção o factor humano poderá ganhar novas relevâncias e renovadas perspectivas na estrutura das novas organizações.
4.3 Que perspectivas para o futuro?
Os principais factores de competitividade nas empresas são a eficiência de custos, o desenho de produtos, a qualidade do produto, o serviço pós-venda aos clientes de excelência, flexibilidade que permita uma capacidade de resposta rápida às mudanças de mercado, continuidade de funcionamento dos equipamentos em laboração contínua e economia de tempos – Sistema JIT – (Just-In-Time).
O modelo Antropocêntrico de Produção possibilita alta flexibilidade no que respeita às mudanças e conversões e na resposta a erros. Permite uma ênfase na qualidade dos recursos humanos e cuidado na formação. Compreende uma flexibilidade qualitativa deste tipo de recursos. Permite uma integração vertical e horizontal das tarefas e estabilidade no emprego. Cria um enfraquecimento das fronteiras hierárquicas das funções. Lean Production e Reengenharia não devem ser os únicos modelos a seguir, pois é preciso não esquecer os seus efeitos negativos, sociais e económicos, a longo prazo.
Seria desejável seguir uma estratégia concertada com a aplicação de vários modelos de produção, políticas globais, nacionais e regionais bem definidas, valorização dos recursos humanos e boa integração do ser humano no trabalho. Crê-se que se devia evitar demasiada concentração de recursos humanos nobres, em poucas empresas e, procurar integrar processos de estabilidade na profissão, nas sociedades, com vista a evitar o fundamentalismo dos excluídos.
Estes, acabam por constituir uma reacção natural à falta de perspectivas de uma vida estável e digna que poderá pôr em causa a legitimação das sociedades democráticas e dos próprios estados.
Indica-se, que no futuro, as estratégias de políticas de inovação de processos e produtos serão também de igual importância. A criação de parques tecnológicos pode ser favorável para promover a cooperação entre empresas. Devem promover-se políticas de inovação cultural e de mudança das mentalidades. E, finalmente, parece-nos importante que se crie um clima favorável à inovação organizacional.
5. Qualificações e competências
5.1 Da organização taylorista às novas formas de trabalho
De acordo com uma evolução histórica dos objectivos na qualificação do trabalho, um estudo de António Rodrigues Mota, de 1987, indica que o sistema de qualificações de funções se reporta à classificação da hierarquia dos salários, que deve ser baseada na apreciação do valor de cada função. Esta apreciação deste valor deve ser feita de forma racional através de um instrumento de análise e qualificação dos postos de trabalho, de forma a possibilitar a comparação entre estes.
A primeira classificação de um sistema de qualificações ter-se-á feito em 1912 na Edison Company de Chicago. Em 1925 terá aparecido o método factorial por pontos, com Meril Lott. Neste método, o trabalho é decomposto em vários factores e atribui-se um determinado valor a cada um deles. A cada posto de trabalho atribui-se um determinado valor de pontos, de acordo com uma escala pré-definida.
Na qualificação no trabalho levava-se em linha de conta as exigências permanentes de uma função e definiam-se os vários níveis hierárquicos que a compõem. O objectivo seria o de estabelecer uma política salarial equitativa. Os sistemas quantitativos objectivavam a elaboração de um índice de qualificação, a partir de variáveis, medidas com critérios ditos como precisos e observáveis. A correlação entre as variáveis foi muito utilizada para estabelecer a ponderação entre umas e outras e definir a hierarquia dos postos de trabalho, com vista a estabelecer bases de remuneração conformes.
Na aplicação do modelo neo-taylorista levanta-se o problema das qualificações. As empresas continuam a pensar em princípios rígidos de gestão, orientados para a redução de custos e pouco orientados para o trabalhador e inovação. A produtividade é entendida como dependente da capacidade produtiva das máquinas. O emprego torna-se um valor instável e nem os indivíduos nem as empresas, investem na qualificação ou carreira. Ao não qualificar o trabalhador e, sobretudo, ao eliminar a sua capacidade de iniciativa e de participação, acabam por se desencadear problemas psicológicos e físicos nos trabalhadores.
Os trabalhadores não se sentem adaptados a um trabalho que não lhes dá autonomia e não lhes pede iniciativa, o que faz aumentar as taxas de absentismo e se reflecte num turn-over muito elevado.
Parece indicar-se que o problema da qualificação, na nova era da globalização, modificou o quadro económico dos países e regiões com novos modelos de produção adoptados, com o desenvolvimento de habilitações básicas cada vez mais elevadas e com uma crescente preocupação do desenvolvimento e reconhecimento de competências básicas.
Quando se fala em educação, deve agora introduzir-se a noção de comunidades educativas, onde também as empresas de formação e as próprias organizações de trabalho, através da formação em contexto de trabalho, ou o recurso à formação interna e externa, devem ser incluídas. De igual modo não deve ser esquecida a responsabilidade acrescida de cada um durante toda a sua vida profissional.
No actual panorama, as qualificações passam por alterações profundas, mesmo ao nível do sistema de ensino. Nota-se que 75% da população portuguesa activa tem qualificações que a inibem de se integrar no processo europeu de modernização das empresas, cujas premissas são quase sempre as de formação a partir da conclusão do 9º ano. O que obrigará a políticas intensas de modificação deste quadro e que começam, de resto, a ser agora seguidas.
Segundo Margarida Chagas Lopes, a formação inicial e contínua passa a ser encarada em pé de igualdade, mesmo ao nível do sistema de ensino. Por outro lado, com as novas tecnologias, estamos a entrar numa fase em que são precisos cada vez menos trabalhadores para produzir mercadorias e serviços para todo o mundo. Já não são os diplomas escolares, diz a autora, que detêm a exclusividade de formalização das competências , surgem empresas formadoras acreditadas e certificadas para o efeito. Os postos de trabalho passam a ser um “potencial de acção”, reconfigurando-se uma nova forma que implica um novo e diferente conjunto de tarefas.
Este problema do novo potencial de acção, ou conjunto de tarefas, é muito importante, e acaba por nos conduzir à questão da polivalência, que, se do ponto de vista da empresa pode ser precioso, do ponto de vista do trabalhador pode conduzir à desprofissionalização e deve ser observado com atenção.
Nesta nova concepção de postos de trabalho é fundamental que o empenho envolva a contribuição das diferentes valências na empresa e não, apenas, uma previsão das necessidades de qualificação. O futuro pode passar por organizações que aprendem, qualificantes e em rede. Há abordagens menos positivas que chamam a atenção para realidades não atraentes, que acompanham os desafios ao acaso, com sugestões de tendências menos estabilizadas.
Existem fortes factores de resistência à mudança que se verificam nas estruturas burocratizadas que bloqueiam a inovação e não facilitam a implementação do modelo de competências.
Enquanto a estrutura tecnológica e o sistema educacional não mudarem, segundo Ilona Kovács, as organizações não serão capazes de realizar as mudanças que os teóricos entendem necessárias. Ao nível da estrutura organizacional, parece existir um conflito latente entre três culturas: a dos operadores, dos chefes executivos e dos engenheiros. As culturas organizacionais têm, numa empresa, vários subgrupos de acção ou interacção. A falta de participação nos processos de trabalho pode ser um dos problemas que fazem frente de resistência ao aparecimento de novos modelos de Gestão.
5.2 Conceito de competências
Nós resolvemos servir-nos da definição apresentada por Janayana Silva relativamente à exposição dos conceitos de competências. De resto, na sua essência, muito aproximado a outros, de autores confessadamente mais conceituados e que seria o caminho metodológico, teoricamente mais expectável. Esta apresentação serviu, contudo, melhor, a ideia que começávamos a redesenhar com o quadro teórico. Como notámos eventuais semelhanças, em particular com Zarifian, trabalhámos com este conceito.
Defendem-se três tipos de competências diferentes: competências conceituais, técnicas e interpessoais.
As competências conceituais são conhecimentos que podem ser reconhecidos pelos conhecimentos teóricos da profissão e pelos conhecimentos organizacionais. As suas componentes são as qualificações, a formação profissional, a experiência profissional e as capacidades cognitivas do sujeito, sejam analíticas ou estratégicas. Temos como indicadores: a pós-graduação, licenciatura ou outro complemento de formação académica, a formação interna ou externa, a experiência profissional e os conhecimentos tácitos. Nos conhecimentos organizacionais podemos identificar a capacidade para planear as tarefas, a estratégia individual, a adaptação aos objectivos da missão, os conhecimentos da estrutura organizacional, onde se verifica se os indivíduos conhecem os diferentes departamentos e as suas respectivas missões. As competências conceituais são do domínio do conhecimento e conceitos teóricos necessários à profissão. Representam-se, no nosso modelo, em termos de medida na qualificação profissional, experiência profissional e na formação profissional.
Competências técnicas, são o domínio dos métodos de trabalho que têm a ver com a gestão do tempo, verificando se o colaborador sabe ou não estabelecer prioridades, se é cooperante, ou individualista, ou se, pelo contrário, concentra as tarefas sem lhe dar seguimento competente. Competências técnicas são também o domínio das ferramentas de trabalho que se reflectem no conhecimento dos produtos, no domínio dos processos de execução e na inovação de produtos e formas para realizar o trabalho.
Competências interpessoais dividem-se em capacidades e atitudes, comunicação e criatividade. As capacidades podem ser de chefia, de relacionamento ou de adaptabilidade. As capacidades de chefia determinam se o colaborador exerce a chefia de forma democrática, autoritária, ou individualista. O relacionamento testa a capacidade para trabalhar em equipa e a adaptação à cultura da empresa. A comunicação e criatividade revelam se o colaborador é um facilitador em relação a tudo o que é preciso comunicar aos outros colegas, ou, pelo contrário, retém ou passa informações erradas.
Quanto às atitudes, vamos verificar nos nossos índices a ética profissional, a proactividade, a capacidade de adaptação às mudanças, o empenho e disponibilidade e o sentido organizacional. A ética profissional deve determinar se o empregado identifica uma nova solução, questiona as ordens, ou as executa sem questionar.
De acordo com Janayana Silva a proactividade deverá medir a capacidade de se adaptar às novas atitudes, ou perceber se, pelo contrário, reage mal às novas atribuições.
A gestão de competências representa uma mudança no sentido da responsabilidade e auto-gestão dos funcionários. É preciso ter a percepção da chefia face à competência do funcionário, que na maior parte das vezes é incompleta, isto é, não a conhece bem. É importante saber que, nestes conceitos, não há que levar em linha de conta tudo o que o funcionário faz, mas as habilidades que devem ser fomentadas, protegidas ou mesmo diminuídas.
5.3 Competências tecnológicas e inclusão no mercado de trabalho
Para Janayana Silva, um dos problemas do desenvolvimento de competências prende-se com o facto da modernização tecnológica não se ter feito acompanhar por novos princípios de organização de trabalho. As empresas investem cada vez mais em tecnologia avançada, sem, contudo, formarem profissionais preparados para as poderem usar na sua totalidade. Continuam a pensar em princípios de organização rígidos e orientados para a redução de custos, pouco orientados para o trabalhador e inovação.
As organizações de trabalho procuram pouco a flexibilidade qualitativa, continuando a procurar a redução de custos em mão-de-obra, e o aumento da produtividade através desta via. Para tanto, reforçam, ainda mais, o controlo centralizado, um pouco em contradição com o que parecem afirmar. A produtividade é para a maior parte das empresas, entendida como dependente das máquinas, devendo estas, progressivamente substituir o capital humano.
Apesar de tudo, entende-se que a introdução das novas tecnologias tem inevitavelmente, provocado a criação de novos saberes, de cariz essencialmente intelectual de carácter mais geral, bem como capacidades de comunicação, aprendizagem contínua, de cooperação e trabalho em equipa.
A produção em grande série, ainda que tenha vindo a perder alguma supremacia, continua a ocupar um espaço muito importante no panorama das organizações de trabalho, mundiais. Nem o anúncio de um mercado estável, nem o do fim do fordismo, permitiram mudar o rumo das organizações, facilitando a criação de postos de trabalho destinados a recursos humanos qualificados e polivalentes.
Outros estudos, numa perspectiva mais animadora, indicam a tendência de uma crescente profissionalização, com aumento de categorias de elevada qualificação. Cremos que a aposta, para o futuro, deve ser programada e estratégica, considerando três agentes: o Estado, a empresa e o trabalhador.
A inovação tecnológica afecta o emprego e a estrutura do emprego. Pode, por si, diminuir os custos do produto e reforçar a competitividade, condição indispensável para a renovação da actividade económica. As empresas estão hoje plenamente conscientes da necessidade de implementação de novas tecnologias nas situações de emprego. Faz-se cada vez menos apelo às capacidades culturais e mais à inteligência criativa, que, por si só, cria necessidades de formação e empregabilidade e estão associadas a medidas de flexibilidade.
Torna-se necessário configurar novas estratégias de competitividade da empresa, associadas aos níveis de qualificação e competências. A empresa deve saber identificar quais as exigências em matéria de qualificações e competências. Deve configurar estratégias de competitividade empresarial associadas à elevação do nível de competências.
De acordo com Paulo Pereira de Almeida e Glória Rebelo, a permanente inovação tecnológica implica mudanças na organização do trabalho e isto conduz-nos a uma premência na antecipação de medidas de gestão que antecipem as alterações tecnológicas, bem como, as necessidades dos clientes e mercados.
As novas tecnologias alteram a duração no local de trabalho e modificam as condições do trabalho e do emprego. Se, por um lado, podem fazer perder empregos, por outro, podem aumentá-los, na medida em que permitem aumentar a competitividade económica quando aliadas a medidas de flexibilidade ofensiva e estratégica. Acabam por induzir a novas necessidades de formação e de competências, tornando mais fácil a actividade profissional.
As tecnologias de Informação, nas organizações, parecem levantar um aspecto que se tem demonstrado controverso e que se prende com a rotação, reconversão e substituição de trabalhadores na empresa. As novas tecnologias exigem do trabalhador qualificações específicas. Normalmente os processos de recrutamento têm isso em conta. Contudo, parece indicado deslocar trabalhadores para funções mais adequadas, ao mesmo tempo que se iniciam novos processos de formação, e adequar os planos de carreira, de forma a conseguir a máxima produtividade sem perder de vista a motivação e satisfação no trabalho.
As tecnologias de Informação continuam em expansão o que implica a criação de novos postos de trabalho que requerem dos empresários novas mentalidades, relativamente a métodos e organização do trabalho.
Paulo Henrique Possas refere que os profissionais do curso de computação devem ter uma visão humanística e uma crítica consistente sobre o impacto do seu trabalho na sociedade e na organização. O seu novo papel é o de facilitar e estimular o aparecer de novas competências de utilizadores nos novos sistemas e nas organizações. Para isso é preciso perceber como é que eles se podem tornar em implementadores da lógica da competência. É preciso que os supervisores e gerentes saibam delegar responsabilidades. Os utilizadores, por sua vez, devem ser chamados ao processo de implementação dos sistemas e ser parte activa no processo.
5.4 Saber e conhecimento tácito
Os anteriores sistemas têm vindo a ser considerados demasiado rígidos e pouco adaptados à realidade empresarial, pelo que começa a fazer notar-se o aparecimento de outros conceitos e a querer abandonar-se a antiga ideia de qualificações, como já referimos. Alguns autores continuam a usar o termo qualificações, pressupondo uma nova interpretação e definição de conceito; outros preferem usar o termo competências. Alguns outros, ainda, usam ambos os termos, fazendo a diferenciação entre qualificações, competências e habilidades. Para nós, a qualificação é uma componente do conceito de competências conceituais.
Jorge Carrillo entende a qualificação como um conjunto de habilidades, conhecimentos, criatividade e responsabilidades que os trabalhadores precisam para os seus postos de trabalho. Acrescenta-lhe um último atributo que é a cultura empresarial corporativa. Esta cultura verifica-se através da colaboração entre trabalhadores, grupos, equipas de trabalho, níveis hierárquicos, práticas interdepartamentais e pela participação activa dos trabalhadores nos processos de produção. Parece-nos um conceito alargado de qualificação.
Este autor, sobre a actual qualificação, desqualificação ou requalificação, defende que o problema se encontra relacionado com as estratégias empresariais, com os mercados externos e internos, e também com o tempo em que se processa a introdução de quaisquer reestruturações que a este nível se façam. Neste novo quadro de qualificações as escalas de medição são menos importantes, orientando-se mais para a aprendizagem e menos para a educação e escolaridade. Centra as qualificações de acordo com três posicionamentos diferentes: os atributos do indivíduo, as exigências do próprio posto de trabalho e a estratégia organizativa.
Marcelle Stroobants escreve a propósito da questão do saber e do saber-fazer do trabalhador, considerando que esta questão se tornou claramente interdisciplinar e que, para encontrar os saberes dos trabalhadores, é preciso procurá-los mais além do que se tem feito, e para além das aparências.
Entende que os saberes dos operários são mais ricos, mais globais e mais complexos do que o previsto. O que se acrescenta de novo a um pensar taylorista será o facto de se considerar que as práticas cognitivas dos trabalhadores são necessárias, o que nos parece evidente, sobretudo num quadro de cada vez maior complexidade do quadro produtivo.
As manifestações de criatividade operária, vêm acabar por confirmar quanto é relativa a figura de ignorância que se atribuía ao operário. No seu entendimento seria importante integrar a questão do saber, do saber-fazer, do conhecimento e da qualificação, mostrando aos trabalhadores uma participação activa na mudança. A autora acrescenta que o saber tácito é de inegável importância e pode nunca conseguir chegar a ser integrado na tecnologia. Pelo que, as organizações, quando dispensam trabalhadores mais antigos na organização, ou profissão, estão a perder um saber acumulado que podem nunca mais recuperar. Stroobants prefere o uso dos termos saber e saber-fazer, entrando em ruptura com a ideia de separação das mãos e cabeça, própria do processo taylorista.
José Monteiro Hipólito refere que os conceitos de competências e habilidades começam a aparecer para redesenhar as novas atitudes. Que começam a notar-se em estruturas organizacionais mais flexíveis, tentando integrar novas ideias e novos sistemas de remuneração. Uma das suas grandes vantagens parece ser o de estimular o desenvolvimento contínuo dos profissionais e o aprofundar do seu compromisso para com a empresa. E em nosso entender, o conceito de competência parece integrar novas formas evolutivas de organização de trabalho, que podem ser adaptadas ao modelo de produção ou ao perfil organizativo.
As competências facilitam um mapa de mercado de trabalho. Um mapa de mercado de ocupações, uma possibilidade de reconhecer as áreas de desempenho e os níveis de profissionalismo. Dentro de cada área estabelecem-se grupos ocupacionais e ocupações. Criam-se, níveis de competências de forma a criar sistemas nacionais de formação profissional. Afirma-se que as competências são características das pessoas que incluem conhecimentos habilidades e atitudes, que levam ao desempenho em determinados contextos.
5.4.1 A preponderância do saber-fazer
Marcelle Stroobants em Trabajo e Competências, afirma que, quando os sociólogos falam de novas competências e saberes sociais, se dá uma volta fundamental na actividade profissional. Inverte-se o sentido do critério formal, da apreciação da qualificação. Passa a deduzir-se, uma definição da qualificação, a partir, directamente, do posto de trabalho. As requalificações são, não tanto uma exigência da organização de trabalho, mas antes uma construção social. Desde meados da década de 80, os programas de investigação indicam que os termos saber e saber-fazer, nos trabalhos que enquadram a tríade tecnologia-emprego-trabalho, tendem a deixar cair o termo qualificação, como já havíamos referido.
A perspectiva, segundo Stroobants, nos estudos recentes, que enquadra o conhecimento técnico-social do processo de trabalho, será a de colocar a questão de forma integrada, do saber, do saber-fazer, do conhecimento e da qualificação, mostrando aos trabalhadores uma participação activa na mudança.
A autora, socióloga, considera que a psicologia, a ergonomia, a antropologia e a filosofia das técnicas, vieram dar um aporte fundamental que permite olhar o problema por um prisma diferente. Marcelle Stoobants indica que o caminho em termos de qualificações seria a procura de uma exegese das duas lógicas, a do saber, associado ao conhecimento, e do saber-fazer, associado à execução, sem que se abandone a voz da experiência.
Cremos, que o conceito de competências permite perceber a integração dos diferentes saberes: conhecimento e saber tácito. E também pensamos que nenhum deles, numa análise conjunta, deve ser dispensado.
6. As competências e o mercado de trabalho
6.1 A aprendizagem ao longo da vida e o desenvolvimento de competências
Segundo Helena Lopes, a capacidade de aprendizagem, um problema assaz importante na implementação da gestão por competências, está no coração do sucesso económico. No contexto da globalização e da “learning economy”, a capacidade de aprendizagem é fundamental para o sucesso económico dos indivíduos, das regiões, das organizações e das nações. Para a autora, aprender consiste ”em construir novas competências e adquirir novas capacidades”. No entanto, são sobretudo os trabalhadores mais instruídos que possuem a consciência da necessidade de aprendizagem ao longo da vida.
Falamos em organização qualificante quando a empresa constrói as competências necessárias à sua sobrevivência. A criatividade de trabalho deve ser por si uma fonte de aprendizagem. As modificações organizacionais devem repercutir-se nas modificações dos perfis de competência.
Esta nova lógica de competências está na origem, para Paulo Pereira de Almeida e Glória Rebelo, da necessidade de reconciliar as exigências da flexibilização de trabalho e da competitividade que criam grandes mutações nas empresas, incluindo a introdução acelerada de novas tecnologias de informação e comunicação, e pelo movimento da deslocalização do trabalho.
O tema das competências assume-se, para alguns autores, como um tema de moda, que apenas vem colorir velhas questões, acabando por não trazer nada de novo e apenas criar mais um equívoco dos movimentos reformadores. Outros estudiosos analisam a questão de forma oposta, dando-lhe um carácter de ruptura de mentalidades e reorganização do trabalho e da remuneração.